quinta-feira, 3 de abril de 2014

Brincar com o tempo dos outros nos semáforos

Esta semana, estava eu a descer a pé a Avenida Duque de Ávila em Lisboa, pelo seu lado direito (notícia-choque: eu não ando sempre em cima de uma bicicleta!), quando cheguei ao semáforo que me permitia passar para o lado que dá acesso à Avenida da Liberdade. Ao chegar, verifiquei que o semáforo estava vermelho e já estava uma pessoa parada à espera. Estava também um carro parado no semáforo, igualmente vermelho. Todos esperámos e... nada. Nenhum dos vermelhos passava a verde. Outras pessoas a pé aproximaram-se da passadeira e após esperar dez segundos atravessaram a correr. Eu e quem já lá estava aguentámos estoicamente. E continuámos a esperar, a esperar... Finalmente, o verde caiu. O verde para peões, entenda-se.

Tínhamos estado ali a olhar para o semáforo e a obedecer-lhe com cidadania paciente, mas afinal percebemos que o semáforo está-se nas tintas para os peões e manda-os parar só porque gosta de os ver do lado de lá enquanto os automóveis estão com o semáforo igualmente vermelho. Ou talvez o programador do semáforo queira proporcionar-nos um momento de pausa, de reflexão no buliço da vida citadina ou quiçá ainda uma história de amor com o vizinho atravessador. Nesta cidade tudo é possível.

Mas o que é verdade é que, em consequência, as pessoas deixam de acreditar nos semáforos. E quem chega à passadeira e vê o vermelho para peões nunca sabe se o verde para os automóveis vai abrir entretanto ou se vão ali ficar especadas à espera sem justificação, a perder o próximo comboio de metro, o próximo autocarro ou ser despedidas por um atraso que foi a gota de água. Como percebem que há um erro na configuração do tempo, atravessam mesmo no vermelho. Dá-se a quebra de confiança no sistema.

Veja-se que até perdi ainda mais tempo a filmar o que descrevo (segue-se um vídeo mal filmado - mas muito arty -  com o meu telemóvel, onde não conseguimos perceber se está ou não vermelho para carros e pessoas ao mesmo tempo. Mas ponho-o na mesma, que um vídeo dá sempre um ar janota a qualquer blog, que é o que isto é):


Eu comecei a filmar no momento em que ficou vermelho para automóveis. Em oito pessoas, apenas uma faz o compasso de espera, aguardando o sinal verde quase até ao fim (quando desiste de ser lorpa). As outras já devem saber com o que contam daquele sinal e fazem algo que é... proibido. Cá estão os loucos dos peões a atravessar no vermelho e a serem culpados de serem atropelados. Acendeu o verde para peões 2 segundos antes do fim, o que dá cerca de um minuto de espera inconsequente.

Enquanto observava este exemplo da má gestão semafórica que despreza as pessoas a pé, ocorreu-me voltar a utilizar o site de denúncias de ocorrências da Câmara Municipal de Lisboa que serve precisamente para este fim, o Na Minha Rua. Descrevi no último post como ele funciona bem e a tempo, mas eu queria dar outra oportunidade ao sistema, porque podia eu ter tido azar.

Ao pesquisar no mapa da dita ferramenta o local em causa para pôr o pin, reparei que já havia alguns na zona. Fui clicando até que:


OCO/8471/2012 Avenida Duque de Loulé
OCORRÊNCIA: Semáforos e Sinais luminosos em falta ou para manutenção
DESCRIÇÃO: Não é mínimamente admissivel impôr aos peões desperdício de enormes tempos de espera, quando também o transito automóvel se encontra impedido de circular.
Refiro-me, nomeadamente ao atravessamento dos peões na A.Dq.Loulé no local em que esta desemboca no Marquês. Nem os peões atravessam, nem os carros avançam para a Rotunda.

ESTADO: Em análise
RESPONSÁVEL: Câmara Municipal de Lisboa

Já um ilustre indignado se tinha apercebido do mesmo problema e queixado no portal que a CML recomenda ser o melhor para o efeito... em 2012. Na melhor das hipóteses, o semáforo está assim há um ano e três meses, sem que nada tenha sido feito. A queixa está em análise.

Deduzo que o semáforo está assim desde que foi colocado aquando da inauguração das obras do Marquês de Pombal, com aquele episódio caricato da falta de caleiras para a água. Se não se lembram, sigam o link (é de mais reformados destes que o país precisa e, veja-se, ele tinha razão). Um ano e seis meses de semáforo mal temporizado, and counting.

Já agora, para quem acha que um minuto de espera escusada não é nada de especial, sugiro que parem tudo agora mesmo e contem 60 segundos. Quem passar do 20 ganha o prémio Pachorrento do Ano:


Vidas destas não há muitas, convém aproveitá-las.

sexta-feira, 21 de fevereiro de 2014

Câmara de Lisboa - A ultrapassar situações desde o primórdio dos tempos

A 23 de Novembro de 2012, há coisa de um ano e três meses, publiquei o post Viadutus Interruptus. Como sou um cidadão exemplar e amigo das novas tecnologias, apressei-me a fazer a respectiva denúncia da situação na plataforma Na Minha Rua da Câmara Municipal de Lisboa (CML). Diz que esse é o método mais rápido de fazer chegar a solução ao problema detectado.

Hoje recebi uma mensagem da CML informado que "Esta situação encontra-se ultrapassada".

Agradeço a atenção e urgência que dedicaram ao assunto. É de salientar que não tive que esperar dez anos por uma resposta, como (por exemplo) no caso dos nossos tribunais. Não, em menos de ano e meio trataram de um perigo manifesto e imediato que punha em perigo a integridade das pessoas. Aqui está demonstrada a sensibilidade e eficiência dos serviços camarários para com os seus habitantes.

A eles, o meu obrigado.


PS: O problema está "ultrapassado" (eu reparei na exactidão de não terem usado a palavra "resolvido") há pelo menos um ano, dado que cerca de dois meses depois do post voltei ao local e já não havia quaisquer barreiras, visíveis ou invisíveis. Agradeço assim a demonstração de coordenação do serviço "Na Minha Rua", dúvidas houvesse.

quinta-feira, 23 de janeiro de 2014

Bicicletas passam vermelhos a alta velocidade - A PROVA

Esta semana decidi parar por breves minutos numa passadeira de Alcântara e filmar o que acontece quando cai o sinal vermelho para quem circula na estrada. Rapidamente obtive as imagens que provam a perigosidade das bicicletas a passar vermelhos, um grave problema da segurança para peões. Finalmente, a prova que faltava da rebaldaria que por aí vai.

Confiram o primeiro vídeo:



Viram as bicicletas? Eu também não, pelo que repeti de imediato a gravação, porque algo de anormal terá acontecido:




E agora, viram-nas?? Mas que raio, onde é que elas se escondem?

Esperem, já percebi! Elas estão tapadas pelos automóveis e motas que, vendo um ciclista a preparar-se para passar um vermelho a alta velocidade, aceleram e colocam-se ao seu lado de forma a proteger potenciais crianças e outros peões indefesos do perigo do embate, assim lhes batendo primeiro. Toda a gente sabe que um automóvel com aquela chapa toda é um amortecedor natural de embates contra pessoas.

Estes automobilistas estão a oferecer a chapa ao manifesto no mais puro desprendimento, em benefício do peão.  E ainda por cima, sem que se perceba, porque ao olho desatento parece que são eles quem estão a cometer uma infracção/crime/estupidez (escolham um).

E os ciclistas, lá continuam, impunes. É bárbaro, o nosso país.

sexta-feira, 17 de janeiro de 2014

(Demonstrar a falácia do IUC para bicicletas) É desprestigiante, disse ele.

Os comentários nas redes sociais nunca cessam de nos surpreender. No caso da promoção da utilização da bicicleta como meio de transporte e da melhoria das condições subjacentes, ocorre normalmente uma inflamação de opiniões superior à das notícias sobre aumentos de impostos. A desinformação e o achincalhamento são aqui normais.

É compreensível. Mandar um petardo a fingir de argumento é fácil, rápido e tem um potencial de estrago razoável, especialmente se repetido e disseminado. Lança a confusão, a dúvida e para rebater é sempre preciso tempo e esforço para desmontar o que em bom português não passa de Lógica da Batata, que tanta escola faz neste canto ibérico.

Mas descubro que é ainda mais grave o problema e que, afinal, não basta responder à desinformação como tentei no post anterior. Não, demonstrado o ridículo da acusação do não pagamento de Imposto Único de Circulação por parte das bicicletas, perdão, velocípedes, vem o Rui Gomes na caixa de comentários queixar-se que afinal este é um não-assunto:


Curioso mas nunca vi ninguém em fóruns de rsocial, pelo menos que merecesse algum credito, a tecer qualquer comentário, depreciativo pelo fato das bicicletas estarem isentas ao IUC. portanto é um tema que não é tema... e pelos vistos também só serve para alimentar e até em desprestigio levantar essa questão no sense a quem nunca tinha ouvido comentar."

Portanto, está aqui o Rui Gomes a dizer que eu perdi o meu tempo e prestígio a ilustrar o ridículo do IUC para bicicletas, perdão, velocípedes, pois nunca ninguém tinha tecido qualquer comentário nesse sentido nas redes sociais.

Desconheço os fóruns de redes sociais frequentadas pelo Rui Gomes, se se trata do Clube Golf Portugal, do Canaricultura Tuga ou o Café Central, no Penteado:



Matraquilhos! Quem não gosta de matraquilhos? 
E fica no Penteado, pelo que _______________ - espaço para o vossa piada preferida, deixo à liberdade de cada um


Mas naquilo que entendo por "fóruns de redes sociais", deixo-vos alguns exemplos:








Nos comentários a uma notícia do Jornal de Notícias




Comentários a um artigo do jornal Público



Este comentário abaixo, na mesma notícia do Público, é um dos mais preciosos que já li. Veja-se o esforço que o seu autor faz para justificar que as bicicletas têm impacto ambiental elevado: Circulando mais devagar fazem com que os automóveis tenham que travar e portanto estes últimos perdem velocidade, tendo que voltar a acelerar para recuperar essa velocidade. Com isso produzem mais CO2, por culpa das bicicletas. É de génio!


"Por fim, e pegando nesta citação: "O IUC serve para mitigar os custos dos impactos ambientais e sociais que o tráfego rodoviário acarreta e não apenas para a construção e manutenção das infraestruturas viárias(...)". Quero insistir no exemplo das bicicletas a circular na Marginal, onde os carros circulam a 70Km/h (ou mais, já fora da legalidade) e do embaraço ao trânsito que os vários ciclistas que a povoam (quase todos em âmbito desportivo, e quase nunca na óptica da mobilidade) tendem a causar. Há um grande impacto social nos automobilistas e nas situações perigosas que originam, e há um maior impacto ambiental devido à quantidade de carros que têm que travar e voltar a acelerar depois de os ultrapassar."


Seguindo esta lógica, deveríamos estar todos a lutar pela abolição das passadeiras. O pára/arranca do automóvel por causa dos atravessamentos de peões provoca aumento da poluição. Estes deviam atravessar apenas quando não tal não obrigasse um automóvel a travar. 

Aliás, há uma grande desfaçatez em quem quer andar a pé, com a mania que é mais "verde", pois reivindicam o espaço público com passeios e praças que podiam muito bem ser reservadas ao estacionamento automóvel, facilitando-o. Já viram quanta poluição é causada por automobilistas a andar às voltas à procura de estacionamento, por o espaço ter sido reservado para peões (que mais não fazem do que passear, veja-se)? Eu pensava que o excesso de poluição na Avenida da Liberdade que levou à instauração de um processo europeu era causado pelo excesso de tráfego, mas agora percebo que é pelo excesso de passadeiras. Fico muito grato por terem trazido luz e razão a um problema desta dimensão.


E chega, que já me dói o cérebro.


Mas atenção que o comentador Rui Gomes previu que eu pudesse achar umas dezenas de comentários a comprovar que o não pagamento de IUC é uma das acusações feitas a quem apenas pretende andar numa bicicleta, perdão, velocípede. E logo acrescentou que nunca viu "ninguém... pelo menos que merecesse algum crédito" a fazer tal defesa. Portanto, para a defesa do IUC ser relevante, não bastaria que a sua imposição fosse proclamada por dezenas de pessoas que se deram ao trabalho de o escrever nos ditos fóruns, tinha de ser por gente "com crédito".

É evidente que, se eu alinhasse na mesma ilógica, a resposta natural ao comentário, seria a de que eu não sei quem o Rui Gomes é, e portanto não me merece qualquer crédito pelo que bem pode falar e comentar à vontade. Mas, nestes termos, responder-lhe seria "desprestigiante" dentro da lógica que proclama, e portanto fiquei calado. 

Agradeço o cuidado que o Rui Gomes tem com o meu prestígio, alertando-me para o "no sense" do meu artigo, mas na verdade eu não tenho prestígio algum. Ou tenho? É que o Rui Gomes comentou, dando afinal relevância ao que escrevi. Estou baralhado, é melhor parar por aqui.


sexta-feira, 3 de janeiro de 2014

IUC - Imposto Único de Circulação e a isenção das bicicletas.

Os média estão ao rubro com as recentes alterações ao Código da Estrada. Eu tenho querido muito escrever sobre isso aqui, a sério. Mas depois leio os comentários às notícias e dá-me mais para rir. E chorar.

Uma acusação típica de muitos fóruns ou redes sociais é o pagamento de Imposto Único de Circulação de que as bicicletas estão isentas (o código chama-lhes velocípedes, porque o código é muito erudito). No meio de troca de argumentos (cof cof...) sobre a utilização da bicicleta como meio de transporte, há sempre o momento em que a fava é trincada com toda a convicção:

"Então mas se as bicicletas andam na estrada, porque é que não pagam o Imposto de Circulação??"

Pronto, está lançado o caos. As bicicletas não deviam poder circular, porque não pagam Imposto. Eu chamaria a isto inveja, mas na verdade é burrice porque estão a dizer que querem perder um benefício que também os atinge, visto que qualquer um pode possuir e conduzir uma bicicleta. E a grande maioria já o fez, mesmo que com 5 anos.

Mas vamos tomá-los a sério por cinco minutos. O que é que diz, afinal, a Lei sobre o IUC? Eu sou um tipo das leis, tinha que ir ver:

Capítulo I 
Princípios e regras gerais 

Art.º 1.º
Princípio da Equivalência

O imposto único de circulação obedece ao princípio da equivalência, procurando 
onerar os contribuintes na medida do custo ambiental e viário que estes provocam, 
em concretização de uma regra geral de igualdade tributária.
...

Art.º 5.º
Isenções

1 - Estão isentos de imposto os seguintes veículos:
...
d) Veículos não motorizados, exclusivamente eléctricos ou movidos a energias
renováveis não combustíveis, veículos especiais de mercadorias sem
capacidade de transporte, ambulâncias, veículos funerários e tractores
agrícolas;"



Quer dizer que o IUC se destina a obrigar quem adquire um veículo a motor a uma compensação pelo custo ambiental e viário que provocam. Ora então, vamos imaginar por uma loucura de segundos que se aplicava o mesmo princípio às bicicletas. Qual seria o valor a aplicar?

Ora neste simulador, ficamos a saber que uma mota com 125cc (poupando-vos trabalho, é a Tabela E) pagará em 2014 €5,49. Uma 125cc é o veículo mais simples que pode ser taxado ("O quê, abaixo disso também não pagam? Fim aos ciclomotores nas estradas JÁ!!"). Será dos que menos poluí e menor impacto na rede viária tem. Mas ainda assim são máquinas para pesar uns 180kg e sempre funcionam a motor, pelo que poluem bem mais que praticamente zero, que é o que polui a bicicleta.

Numa conta simples, uma bicicleta pesará cerca de 10 vezes menos que a mota 125cc (18kg, umas pesam mais mas a maioria pesa menos). Se pesa 10 vezes menos, o IUC também deve logo, à cabeça, ser 10 vezes menor, porque o desgaste na via tem essa proporção:

Resultado: €0,549 de IUC.

Mas tendo em consideração o custo ambiental, este valor tem ainda que ser reduzido, porque a bicicleta, não funcionando a motor, produz bem menos de metade da poluição num mesmo percurso. Talvez 2%, considerando pneus, óleo na corrente e desgaste das peças.

Ora 2% de €0,549 são... €0,01098, que é como quem diz UM cêntimo. Um cêntimo?? Seria este o valor proporcional do IUC de uma bicicleta e é por ele que tantos fazem tanto barulho? É realmente importante cobrar um valor inferior ao custo da folha onde imprimiríamos o comprovativo de pagamento (Ouch, mais um custo ambiental - cinco milhões de folhas no mundo)?

Ah, e 5 milhões de bicicletas X €0,01098 = €54.900,00. Presumindo que alguma vez haveria o registo dessas cinco milhões de bicicletas, claro. Cinquenta e quatro mil e novecentos Euros. Dá para tapar uns 200 metros de buracos na estrada, presumindo que a burocracia do Estado não gasta mais do que cobra, que seria o mais provável.

Já agora, vejam na alínea e) do referido art.º 5.º do Código do Imposto Único de Circulação quem mais está isento: Os táxis. Sim, os táxis a motor não pagam pelo impacto que causam na via e na poluição que provocam. Mas as bicicletas, meus amigos, essas marotas, não lhes perdoem!

Por mim, para não me chatearem mais, até pago já os meus sete cêntimos, só para não ter que os ouvir. Onde é a caixa de pagamento?

quarta-feira, 23 de outubro de 2013

São As Infra-estruturas, Estúpido!

A minha última passagem por Nova Iorque foi há uns oito anos atrás. Na altura, quanto a bicicletas, praticamente só se viam Bike Messengers na estrada, ou então pessoas a passear recreacionalmente no Central Park.

Hoje, via treehuger, o panorama é radicalmente diferente:





"Ah, mas Nova Iorque é plano!", dirão os cépticos. Pois é. Mas é muito quente no verão - A humidade é de tal ordem (98%) que basta sair à rua para ficar com a roupa colada ao corpo, mesmo sem nos mexermos. Depois, é um gelo no inverno - 10º abaixo de zero e neve. Condições excelentes, não? Mas e quando o tempo não é nem de calor absurdo nem de gelo absoluto, o que acontece é o que se vê nas imagens.

E por cá?

Por vezes também suo ao chegar de bicicleta ao meu trabalho. Mas é o equivalente a meramente sair à rua por 3 minutos no tal calor nova iorquino. E também porque acelero na subida de 50 metros final (culpa da adrenalina), porque em condições normais não há problema.

A grande diferença entre cá e lá está na aposta visível e determinada nas infra-estruturas que foram planeadas e executadas, política essa de que já tinha dado nota aqui há tempos e é a prova de que as políticas que favorecem os meios de transporte suaves são o elemento preponderante no aumento da utilização destes. Só estas atraem as pessoas que não estão dispostas, por várias razões, a misturar-se com o trânsito de uma cidade para salvar-se a si, os seus filhos e o planeta. E provavelmente, são a maioria.

Portanto, se queremos meios suaves nas nossas cidades, com consequente menor poluição (a poluição faz aumentar incidências de certos cancros), mais espaço para todos, mais silêncio (sim, há ruído a mais e ele mata) e menos custos para o bolso de cada um e para o país (nós importamos petróleo e portanto de cada vez que utilizamos os seus derivados estamos a mandar dinheiro para fora do país), temos que accionar políticas com esse objectivo.

De que é que os nossos governantes estão à espera?

António Costa?

quinta-feira, 17 de outubro de 2013

Difícil é Parar

Mas porque é que esta fotografia não é de uma bicicleta na cidade? Simples: Eu não tiro fotografias (que fiquem esteticamente bem) enquanto em andamento no meio do trânsito. É, digamos... perigoso.


Começar a pedalar nas cidades é fácil. As barreiras a vencer são sobretudo psicológicas e estão relacionadas com hábitos instalados numa sociedade que se habituou a ver no automóvel a resposta mais fácil para ir ao café a 2 km de distância. Qual é então a melhor táctica para começar?


Vencer o medo

Actress-fear-and-panic
Esta é uma expressão de "medo". Quando me dizem que não andam de bicicleta na cidade porque têm "medo", só aceito se fizerem ao mesmo tempo esta expressão.

Ter medo é natural. Toda a gente tem medo do que nunca fez. Como quando deu o primeiro beijo (pronto, aqui talvez tenha sido só eu), entrou na universidade, começou o seu primeiro emprego ou até quando aprendeu a... andar de bicicleta! Parecia tão difícil não cair, não parecia? "Como é que me aguento só em duas rodas?", pensávamos. Hoje, nem pensamos. Como nos beijos.

Portanto, toca a levantar esse rabo preguiçoso do sofá e a experimentar dar uma inocente pedalada. Talvez descubram que é mais difícil decidir parar do que que decidir começar.


Ir acompanhado

Para quem não está habituado a andar de bicicleta na cidade, ter companhia com alguma experiência é aconselhável. Se não conhecem alguém experiente podem sempre contactar um Bike Buddy da MUBi, se existir um na área de residência, que poderá acompanhar-vos no percurso que pretendem, dando conselhos de segurança e eficiência. Se nenhumas destas hipóteses for possível, que se lixe: se estivermos à espera de companhia para adicionarmos algo de bom à nossa vida, na maioria das vezes, bem que podemos esperar sentados. Mudemo-nos a nós próprios e os outros que nos sigam.

(vou parar agora com frases auto-motivacionais, antes que este blog caia num precipício obscuro de psicologia de mesa-de-cabeceira do qual dificilmente sairá)


Começar de-va-gar

Deve começar-se por pequenos percursos, para ir até ao tal café, esplanada, jardim, comprar o jornal ou um pequeno passeio de fim-de-semana. Ou então aproveitar uma ciclovia perto de casa para dar uma volta. Sem horários a cumprir, sem stress e com tempo.

Há quem faça uma tirada de 10 quilómetros, na primeira tentativa, o que pode ser um erro para quem não pedala há anos e não tem experiência de andar no meio do trânsito automóvel. Um pouco como ter a ideia de começar a correr, depois de anos de ócio, e começar logo pela meia-maratona. Estão a ver o resultado, não estão?

Portanto, numa primeira tentativa, escolham um percurso simples e fácil, com poucas subidas.


Equipamento

Para começar a pedalar na cidade, não é preciso ter um iPhone, uma Schwinn cheia de pinta, nem mesmo um capacete (que só usa quem quer e eu só o usava quando andava de BTT pelo meio de trilhos cheios de pedras, buracos e árvores a 50km/h ou mais - quando era, portanto, um radical).

Esclareço que para além da ideia de protecção, podem optar por usar um capacete com outra intenção:

(Por que razão o capacete está a proteger apenas a metade posterior da cabeça, deixando a metade frontal a descoberto? Leia abaixo para uma explicação mais que razoável)

Se repararem, ao contrário da maioria das pessoas, esta ciclista urbana não deve gostar de ter o cabelo ao vento e portanto decidiu encafuá-lo protegê-lo dentro de um recipiente a que outros estranhamente chamam capacete. Ou então, faz parte de um processo de penteado moderno, e o capacete recipiente não passa de uma forma (ler fôrma) e quando ela o tirar, vamos ver isto:



  (eu não julgo ninguém)

Ora aqui está uma razão convincente para passar a usar capacete. Quem não gostaria de ter um cão na cabeça, para protecção? É caso para dizer: "Que bonito cãobelo tu tens!" BÉU, BÉU!!


Circular no passeio

Que as primeiras pedaladas sejam no passeio é tão certo como um ciclista estreante se perder na ciclovia da zona ribeirinha de Lisboa (Cais do Sodré - Belém). Aliás, se a estreia for na ciclovia da zona ribeirinha, parte do percurso é no passeio, portanto faz logo um dois-em-um. Vezes dois. E dois-em-um vezes dois, porque vão descobrir que esta ciclovia não liga com mais ciclovia nenhuma que dê a volta ao ponto de início (ou qualquer outra volta), portanto têm que regressar pelo mesmo caminho em que vieram e perder-se novamente em sentido inverso.


Mas é habitual que pessoas inexperientes comecem por andar nos passeios, com receio dos automóveis na estrada. Eu também já o fiz, em zonas onde o passeio é muito largo e praticamente não há peões, quem sou eu para recriminar? MAS, nunca esquecer que, em todo e  qualquer caso, no passeio o peão é rei e senhor. Circular no passeio de bicicleta é proibido, por mais que certos condutores e até alguns polícias vos encaminhem para lá (sim, sei de várias histórias em que o polícias mandaram ciclistas para o passeio).

Por favor nada de razias, sustos, velocidades elevadas ou confrontações junto de peões. O peão tem SEMPRE prioridade e devemos acautelar SEMPRE a sua segurança. Se houver crianças, prever que são imprevisíveis e antecipar que podem mudar de direcção a qualquer momento. Um dos mandamentos do ciclista deve ser não fazer aos peões no passeio (e na estrada também) o que não querem que os automóveis vos façam na estrada. E a estrada é a via indicada para a bicicleta, enquanto que no passeio ela está em permanente violação da lei. Combinado?

E então, do que é que estão à espera para agarrarem aquela pasteleira/BTT/bicicleta de corrida há tanto tempo parada na arrecadação e irem dar uma volta?

(Eu ia pôr aqui uma fotografia parva com um comentário idiota como os de cima, para acabar o post mas depois decidi não o fazer. Entretanto enganei-me e publiquei mesmo com o início desta frase, pelo que agora fica aqui este apontamento ainda mais idiota.)

segunda-feira, 16 de setembro de 2013

Wadjda - De bicicleta, rumo à liberdade.

A bicicleta facilmente representa o progresso, a mudança e a liberdade.

Esperemos que este filme estreie em breve em Portugal, senão lá teremos que aguardar pela próxima edição lisboeta do Bicycle Film Festival, cuja edição 2013 terminou este Domingo.




A sinopse do filme, via Público.


sexta-feira, 16 de agosto de 2013

Em Lisboa como em Berlim e Estocolmo

Uma rapariga ciclista, habituada aos ares de Estocolmo e Berlim, chega a Lisboa e esquece rapidamente a bicicleta, porque, comparavelmente, é uma cidade impossível de percorrer à força de pedais.

Certo?

Ups!:



Não conheço a Kathrine Bakke, mas ela parece conhecer Lisboa muito bem. E para a Kathrine, do aeroporto a casa, o meio de transporte é a bicicleta.

Ah, mas nessas cidades não faz tanto calor como em Lisboa!

Vejamos:
A fotografia foi tirada há duas semanas, já com o Verão a decorrer e no que parece ser o fim do trajecto, Kathrine sorri e cumprimenta-nos com um sinal de vitória. Não parece estafada, nem a suar com a roupa colada ao corpo (para infelicidade da ratio sexy deste post) ou com a língua de fora. Terá um sistema de refrigeração pessoal e portátil avançado? Será uma rapariga fria como a terra de onde provém, imune a qualquer subida de temperatura? Vinha a mascar pastilhas de Listerine? Para o Ciclo-céptico lisboeta tudo será possível, menos que a rapariga tenha chegado ao centro da cidade de bicicleta, vinda do aeroporto sem esforço de maior.

Esta norueguesa escreveu ainda um artigo sobre Lisboa, onde a podemos ver numa fotografia com uma bicicleta de montanha, ups, é de corrida!, normalmente mais usada em competição cidades com poucos declives. Não para Lisboa, é óbvio.

Portanto, todos admitirão que é possível usar a bicicleta em Berlim ou Estocolmo, porque lá é que é fácil, com temperatura amena e estradas planas e sossegadas. Um natural de um desses países, aqui, desistiria às primeiras pedaladas.

De certeza absoluta.

Vá Kathrine, deixa lá a bicicleta, não vez que aqui não dá?


quarta-feira, 31 de julho de 2013

A propósito de circular de bicicleta a par

Nota prévia: Tinha começado a escrever este art.º antes das alterações recentes ao Código da Estrada que vai passar a permitir a circulação de bicicletas a par, em certas situações. A situação abaixo descrita passará a ser legal, o que mostra que a Assembleia da República concordou que esta é uma prática viável, desde que não perturbe o trânsito. Ainda assim, julgo que a história tem interesse por ser reveladora do status quo.

Aqui há uns tempos, pedalava eu acompanhado por volta das onze da noite na Avenida 24 de Julho, quando um carro da PSP abrandou ao nosso lado. Baixaram o vidro e um polícia dirigiu-nos umas palavras que não percebemos à primeira. Pretenderiam avisar-nos de algum perigo eminente?

Pretendiam, sim. Mas parece que o perigo, para eles, éramos nós.

- Como?
- Têm que ir em fila! Não podem andar lado a lado!

Foi aqui, em Lisboa, na Av. 24 de Julho, onde se inicia a Av. da Índia:


Foto retirada do mapa da Google com edição gráfica claramente produzida por mim.
A verde, as duas bicicletas reproduzidas.


Numa via que tem três faixas de rodagem e a uma hora em que pouquíssimos carros circulavam (séries de 7 ou 8 que ficavam retidos no semáforo atrás de nós e nos passavam em segundos), ocupar a via mais à direita e deixar as outras duas livres era uma contra-ordenação que os zelosos agentes não poderiam passar em branco. Possibilitar que duas pessoas circulem nessa faixa à direita, protegendo-se melhor dos automóveis (porque mais visíveis) conversando um com o outro, numa cidade genericamente silenciosa, no centro dessa cidade, é demasiado grave para que se fechasse os olhos.

Todos os dias (também poderia dizer "Todos os minutos de cada dia ou noite") há automóveis a circular naquela avenida em evidente excesso de velocidade (o máximo permitido é 50km/h), a passar vermelhos (normalmente praticam estas duas violações em simultâneo) e a ultrapassar pela direita. Nunca em momento algum, das centenas de vezes que ali passei a pé, de bicicleta, mota ou carro vi algum condutor a ser admoestado pela polícia por tal infracção.

É inclusive comum que os automóveis me façam razias, quando eu, pretendendo seguir em frente, sou ultrapassado em cima da saída para a direita, na continuação da 24 de Julho. No desenho abaixo percebe-se melhor:


A verde, eu de bicicleta, a vermelho, o trajecto habitual dos automobilistas, cortando-me o caminho e pondo-me fisicamente em perigo 


Esta é objectivamente uma manobra muito perigosa, mas também nunca vi um automobilista a ser parado para o chamarem a atenção. Aliás, é óbvio que os automobilistas o fazem porque sabem que escapam facilmente. 

A verdade é que a bicicleta é um alvo fácil de qualquer autoridade, enquanto que um carro a 80km/h é difícil de fazer parar, nas mesmas circunstâncias. 

Não faltam apelos pela internet fora a que se multe e ordene o trânsito de bicicletas, que é escasso. Mas nada se diz ou faz quanto aos permanentes e perigosos comportamento de muitos automobilistas. Nada me move contra estes, pelo contrário, todos têm o seu lugar. Mas não podemos aceitar que alguns imponham a sua lei pela força, colocando os outros em perigo.

No trânsito de bicicletas pela estrada ao lado do restante trânsito, é o ciclista quem está sempre em perigo real, independentemente de quem cumpre a lei, pelo que os ciclistas experientes procuram adoptar sempre o comportamento mais seguro, independentemente de ser ou não o legal. É uma questão de sobrevivência.

É que há uma razão para os altos índices de sinistralidade que continuamos a ter, e a a culpa não é das bicicletas.

































sexta-feira, 14 de junho de 2013

Promessas, trá-las as eleições, leva-as o tempo.

Ainda recentemente na Avenida da Liberdade, a proposta inicial de reordenamento do trânsito apresentada por António Costa propunha, entre outros, a remoção de uma das vias de estacionamento nas laterais. A proposta parecia inclinada no bom sentido, mas e hoje, o que se passa?

Hoje, continua tudo tal e qual estava antes nessas laterais, apesar dos desejos recentemente manifestados pelo Presidente da Câmara. Nem menos estacionamento, nem menos vias de circulação, nem mais área pedonal perto dos prédios, nem mais áreas cicláveis. Só a repavimentação da pista central, área privilegiada de aceleração automóvel a velocidades bem para além das legais. Agora anda-se e pedala-se por lá muito melhor, sem dúvida.

Enquanto isso, em Nova Iorque, há quem faça em vez de manifestar boas intenções, e com resultados à vista:


Ver no Treehugger.


quarta-feira, 12 de junho de 2013

Um mês interinho de bicicleta para o trabalho




  • Neste mês não choveu nunca
  • Não fez muito calor
  • Não apanhei muitas subidas
  • As que apanhei não deram cabo de mim, as mudanças resolveram
  • Gastei 0.0 € em gasolina
  • Pelo que não poluí a cidade
  • A minha mota não se desgastou
  • Sinto-me mais enérgico e tenho mais sono no momento de dormir
  • Não houve furos
  • Houve sorrisos, muitos e bons.
(em resposta a quem não anda de bicicleta em Lisboa porque faz muito calor, frio, são muitas subidas, chove, ronhonhó, ronhonhó, zzzzzzzzzzzzzzzzzzzzzzzzzzz...)

E tu, do que estás à espera? Para começar, basta um simples passeio num fim de semana, a experimentar. Vá, vai!

segunda-feira, 20 de maio de 2013

Ir de carro para o trabalho engorda

Diz o estudo.

Isto para quem precisa de um estudo para demonstrar o óbvio.

Já as crianças, seguem pelo mesmo caminho. Não haja dúvidas que uma das causas é o excessivo sedentarismo. Um normal dia meu de infância esgotaria muitas das crianças de hoje numa hora: futebol, apanhada, bicicleta, três pauzinhos, etc, ao longo de todo um dia. Também tive computador com os jogos, mas veio mais tarde. Hoje, sai-se da escola directamente para casa, onde há videojogos e televisão.

Pergunto: Porque é que não há crianças a brincar na rua ao final do dia? Eu sei que elas estão nas casas, mas porque não saem? O que vejo de diferente com o meu tempo é que as ruas foram tornadas impraticáveis pela ocupação e velocidade do automóvel. As crianças não saem porque "é perigoso". Que espécie de crianças estamos a educar, quando não permitimos que criem laços com os locais e pessoas onde habitam?

Hoje as crianças saem de casa, quando saem, para irem a pequenos parques onde podem brincar e socializar-se. Isso já não acontece no espaço da rua. E para lá chegar, vão de carro. Não se cria o hábito de usar a rua para nela conviver com a vizinhança. Quem é que convive com meio metro de passeio disponível?

Impressiona-me que veja os habitantes dos bairros poucos interessados na a qualidade do espaço que têm à porta de casa, sendo antes a grande preocupação o espaço para estacionar. Mesmo que esse espaço signifique invadir passeios e passadeiras. São os próprios moradores os primeiros a transgredir, pois o automóvel transformou-se numa ferramenta sem a qual não é possível viver, aparentemente. E Deus os livre de andarem 300 metros até ao carro, para o deixarem em sítio adequado.

Cena habitual a qualquer dia ou hora na Estrada de Benfica

Este ciclo é vicioso e pernicioso. É preciso recuperar a liberdade, o bem-estar físico, o espaço da cidade, o silêncio e a convivência. E a bicicleta vai ter um papel preponderante, não haja dúvidas. Lentamente, é o que já está a acontecer um pouco por todo o mundo. Resta saber se queremos ser dos primeiros ou dos últimos a chegar.



quarta-feira, 8 de maio de 2013

Não foi em Marte, mas na 24 de Julho

Uma crónica do outro planeta, chamado Portugal:

Na passada sexta-feira, eram oito e meia da noite e pedalava eu na Av. 24 de Julho, a chegar a Santos vindo de Alcântara e rumo ao Campo das Cebolas, quando oiço uma buzinadela atrás de mim. Pensei trata-se de algum amigo que me tivesse reconhecido (sim, os meus amigos adoram fazer barulho), mas ao olhar para trás vi que era uma rapariga desconhecida na casa dos vinte e poucos anos a conduzir atrás de mim. Pensei que não seria comigo e continuei o meu caminho, apenas para voltar a ouvir a buzinadela insistente. Olhei novamente para trás e reparei que a rapariga esbracejava apontando para mim. Teria um pneu furado? A luz traseira tinha-se fundido? As minhas calças estavam perigosamente descaídas? Um mistério.

Felizmente, naquele momento e após ser ultrapassado pela rapariga, caiu o sinal vermelho e tive oportunidade de esclarecer a interrogação que tinha. Parei ao lado da janela do carro da rapariga e questionei qual seria o problema. Afinal era simples: Eu ia à frente dela, na estrada. Ela queria andar e eu estava ali. Entendia a rapariga que não tinha que andar a "cinquenta à hora".

Passando por cima da sugestão de que eu seguia a 50km/h numa estrada plana (seriam uns 30km/h na melhor das hipóteses), ainda questionei onde é que ela pretendia que eu andasse e se acaso uma bicicleta estava impedida de andar na estrada. Esclareceu que sabia que eu podia andar na estrada, mas ainda assim ela queria passar e eu, "estava ali". Estava visivelmente inconformada com a situação.

Esclareça-se que "ali", era na metade direita da faixa direita de uma avenida com duas faixas de rodagem e o trânsito era mínimo. Havia carros estacionados ainda mais à direita, pelo que deles guardava a habitual distância de 1,5m (prevenindo embates por abertura de portas dos carros estacionados).

De referir ainda que se parecia à rapariga que ia a 50km/h, então estava a protestar de ir no limite da velocidade legal dentro da cidade. Infelizmente, no calor da situação e porque surgiu uma ambulância em emergência, tivemos que abrir caminho e não acabámos este profícuo diálogo, mas o que sucedeu foi suficiente para me impressionar.

A rapariga protestou buzinando, porque queria andar mais depressa e uma bicicleta impediu-a de acelerar naquele momento, naquela via. Ela tinha esse direito e eu o dever de lhe sair da frente. Parece óbvio.

A verdade é que o limite de velocidade na Av. 24 de Julho não tem qualquer significado. O seu cumprimento é mais a excepção do que a regra. Na maioria das vezes é a velocidade mínima a que todos circulam. Numa via de duas ou três faixas com os peões distantes e separador central, seria preciso um controlo policial permanente para impedir as pessoas de acelerar. Mas não me recordo de um único controlo do género nos últimos 10 anos. Ninguém quer saber do controlo de velocidade em muitas vias da cidade de Lisboa, onde cada um acelera a seu bel-prazer e quando há acidentes, logo se vê.

No entanto é das zonas de Lisboa mais amiga para andar de bicicleta, por ser totalmente plana, ter sempre mais do que uma faixa, permitindo ultrapassagens fáceis pelos automóveis e correr Lisboa de lés a lés. Provavelmente a rapariga achou que eu estava a passear, dificultando o trânsito de forma gratuita, mesmo estando eu com roupa normal (não desportiva) e numa bicicleta de cidade.

Assim se demonstra que acima dos problemas de declives, calor ou chuva, a maior dificuldade está na mentalidade de muitas pessoas, que ainda vêem a bicicleta como uma ferramenta de lazer e não um meio de transporte válido, legítimo e acima de tudo desejável.

quarta-feira, 13 de março de 2013

Andar de bicicleta e NÃO usar capacete

Este é um tema alvo de muitos debates, como uma rápida pesquisa na internet pode mostrar.

Update: Aqui, um óptimo exemplo recente.

Mas há imagens que valem por um longo texto:


Também é fácil perceber que há muitas pessoas a partir cabeças, porque tropeçaram a descer as escadas. Deviam pôr um capacete antes de o fazer?

Acima de tudo, estou do lado dos Pró-escolha: Usa capacete quem assim o entender. Obrigatório é que não.

segunda-feira, 4 de março de 2013

Fazer exercício, sem tempo a perder




"apenas dez minutos de exercício físico diário podem fazer toda a diferença na duração e na qualidade dos ciclos de sono"

Todos sabemos que nem sempre é fácil, muito menos barato, a prática de exercício físico depois do tempo de trabalho. Implica deslocações adicionais a um ginásio que consomem muito tempo e que tem um custo razoável.

É comum ouvir de quem frequenta ginásios "não me apetecia mesmo nada ir hoje, mas tenho pago a  mensalidade e já faltei tantas vezes...". Ou seja, não só se gasta o dinheiro, como ele não tem o aproveitamento que se planeou aquando da decisão de praticar exercício em ginásios.

Ora, substituindo qualquer outro meio de transporte por uma bicicleta em dois dias da semana, é possível fazer esse exercício, com um investimento maior de início, mas com um retorno que perdura anos. Pelo que oiço por aí, a mensalidade de um desses ginásios ronda os 40/50€. Ora em 12 meses são 500.00€, pelo menos, valor com o qual já se pode adquirir uma bicicleta bastante razoável, que durará muitos anos. E com ela poderão fazer exercício todos os dias, com custos adicionais praticamente insignificantes. E nos dias em que não apetecer, não se gasta mais por isso, pelo que não há sensação de culpa.

Tomando a decisão de utilizar a bicicleta para vir para o trabalho, consegue-se integrar o exercício na deslocação e que pode ser moderado ou intenso, conforme a vontade de pedalar mais ou menos depressa. Mesmo que fazendo-o se demore mais 20 minutos na deslocação, ainda assim compensa, pois indo para um ginásio, tinha-se o tempo de deslocação para o mesmo, a aula/sessão em si mesma, mais o regresso a casa. Ultrapassa certamente a diferença de tempo.

E uma coisa vos garanto: nunca, depois de um dia de trabalho me ocorreu: "não me apetece ir de bicicleta". Bem pelo contrário. Depois de um dia difícil, a oportunidade de sair pedalando liberta o espírito e o corpo. Assim, o trajecto, em vez de ser algo que se faz com stress tentando fugir ao trânsito (mas quem está no trânsito, é o trânsito, não esquecer) transforma-se num momento libertador do dia, devolvendo a harmonia ao cérebro e o sorriso à cara.

Dorme-se muito melhor, claro.  



sábado, 2 de março de 2013

Buzinar a ciclistas

Interrompo a longa ausência apenas para dar uma dica aos automobilistas que decidem buzinar fortemente a um ciclista, com a aparente intenção de o incentivar, cumprimentar, gozar, etc.:

Não é fixe.

Explico porquê: Imaginem que estão a conduzir e que o passageiro que levam no banco de trás tira da sua mala uma daquelas buzinas de ar comprimido normalmente usadas em estádios e a activa, sem aviso: 



FOOOOOOOOOOOOOOOOOM

Estão a imaginar o susto? É o que sente o ciclista, misturado com pensamentos do género: "Será que querem abalroar-me?"

Eu sei que é difícil a quem nunca experimentou andar de bicicleta na cidade, mas a ausência de ruído na deslocação é um dos atractivos deste meio de transporte. Daí a beleza da bicicletada nocturna, quando há poucos carros.

Andar de bicicleta é um acto em regra silencioso (excepto quando o estado do pavimento é mau, o que infelizmente acontece em muitas estradas de Lisboa). Eu compreendo que quem vai de carro com vidros fechados que o isolam do que o rodeia, mas cujo veículo produz ele próprio ruído, tenha o hábito de buzinar como forma de comunicar. Mas quando se trata de um ciclista, um simples "Olá" verbal é mais do que suficiente, se estiverem mesmo para aí virados. Estamos combinados? Obrigado.

quinta-feira, 17 de janeiro de 2013

Pedalar é no meio da estrada II

No post anterior, abordei o enquadramento legal que permite aos ciclistas circular no meio da via.

Já agora, um esclarecimento: optei pela título "Pedalar é no meio da estrada", de forma a chamar a atenção para o assunto, dado que normalmente as pessoas mais inexperientes (incluindo muitos ciclistas) acham que é suposto circular-se totalmente encostado à berma. Normalmente fazem-se notar buzinando fortemente ao ciclista que circule mais afastado da mesma. Uns amores. Mas não que o local apropriado seja sempre o meio da via. Mas esse pode ser, em muitas circunstâncias, o local mais adequado, como resulta do desenho abaixo:

Desenho de Bekka Wright, Bikeyface



No fundo, deve circular-se no meio ou perto do meio da estrada por uma combinação de razões que levam a que seja sempre mais seguro para o ciclista que assim previne situações em que possa ficar em perigo. Lembremo-nos que um ciclista é totalmente vulnerável a actos fortuitos, pelo que deve conduzir de forma preventiva para que o acidente seja sempre a hipótese o mais remota possível. É muitas vezes difícil explicar esta realidade a quem nunca andou de bicicleta numa cidade, ou a quem anda mas sempre a velocidades muito baixas, mas vou dar um exemplo a partir da espectacular imagem abaixo, retirada da página que se vê na marca de água da mesma:



Que grande estilo! Era assim que se vivia, no antigamente. Vamos supor (acompanhem-me na forte dose de fantasia) que a senhora  está fixa ao automóvel e que não cairá de forma alguma em aceleração, travagem ou curva. Agora, imagine-se que é a senhora quem controla o carro e que vai atravessar, sentada nele, a cidade. No mínimo, uma cena muito rock&roll. Mas de que forma podemos supor que conduziria? à mesma velocidade habitual? Desceria uma avenida a 70km/h, com um automóvel na sua frente a cinco metros de distância? Circularia encostada a bermas, onde há carros estacionados ou sem visibilidade, que saem às vezes sem olhar, ou abrem uma porta? Pararia a centímetros do carro da frente? O que acham?

Em meu entender, as pessoas conduzem os automóveis muitas vezes de forma arriscada, porque não têm a noção do perigo real. O automóvel isola a pessoa do mundo exterior, filtrando-o, levando o seu condutor a abstrair-se do que o rodeia. O facto de estarem rodeados de metal, sistemas de defesa e segurança dá-lhes (e a mim também, não sou diferente) uma hiper-confiança que as leva a correr riscos que nem sempre são medidos. Também porque na maioria das situações, se vier a ocorrer um acidente, e for um carro o outro envolvido, há uma boa probabilidade de ser "só chapa". E se for com uma bicicleta?

Com uma bicicleta, nunca é "só chapa". A única coisa que protege o seu condutor é o seu próprio corpo, pelo que o factor mais importante na condução é claro:

Evitar que acidentes ocorram. 

Um ciclista inteligente actua sempre de forma preventiva, mesmo que isso signifique infringir a Lei. Porém, no que toca a circular ou não na berma da estrada, esse problema não se coloca, visto que como referi no post anterior, a obrigatoriedade de circular à direita da via não significa exactamente encostado à berma. Aliás, se repararem, nem os automobilistas prevenidos o fazem. Mas porque é que as bicicletas devem circular a pelo menos um metro da berma?

Várias razões:

Algures na Estrada de Benfica, em Lisboa
  • É à direita que estão os escoadores das águas pluviais. As ranhuras destes são muitas vezes mais largas do que os pneus das bicicletas, pelo que estes podem ficar lá presos. Também nunca se sabe quando é que se pode apanhar um destes escoamentos com a tampa "desaparecida" ou partida e portanto um buraco enorme onde um ciclista cairia aparatosamente. Acham isto estranho? Imagine que vai a pedalar encostado/a à tal berma, e no preciso momento em que um automóvel o/a está a ultrapassar depara-se com um buraco. Era de noite e só reparou nele quando estava a dois metros. Que aconteceria? 


Na mesma Estrada de Benfica, uns metros mais à frente do buraco anterior, uma placa partida.

Ou seja, deve-se circular pelo menos à distância que permita evitar estes perigos. E nem todos os escoadores estão tão encostados à berma quanto estes.

...continua.

sexta-feira, 4 de janeiro de 2013

Mais 17,9% de mortes na estrada em 2012

A auto-sociedade é uma doença e as estatísticas servem para sermos manipulados

...mas não segundo a ANSR, com notícia do Público

Em primeiro lugar:

É totalmente incompreensível que se deixem sair estes dados, que têm uma contabilização até Setembro e depois se faça uma referência ao ano de 2012. Se a contagem não é anual nem refere ainda os mortos a 30 dias, não é correcta, ponto. Faz bem o Público em indicar que faltam dados muito relevantes (em 2010 - ano em que estes dados passaram a ser incluídos - , só os mortos a 30 dias foram 197, o que quer dizer que os mortos em consequência de acidentes nos anos anteriores foi ainda maior do que o registado e já era escandaloso), mas não chega.

Divulgar dados dizendo que correspondem ao ano, não incluir dados de 3 meses desse ano, e depois dizer que "Em 2012 morreram 580 pessoas nas estradas em Portugal continental, o que significa uma redução de 15,8% face ao ano anterior." é factual e jornalisticamente falando errado e um logro.

Em segundo lugar:

Façamos as contas. Quantos foram os mortos nas estradas portuguesas até Setembro de 2011, sem contar com as mortes até 30 dias depois do acidente? A ANSR responde: 492, de acordo com os seus registos (soma das mortes registadas nos meses de Janeiro a Setembro, inclusive).

Vítimas Mortais consoante o mês, em 2011

Meses   Mortos
Janeiro 67
Fevereiro 48
Março 56
Abril 50
Maio 45
Junho 51
Julho 59
Agosto 65
Setembro 51
Total 492
Fonte: ANSR


Segundo a contagem relatada pelo Público, a contagem deste ano no mesmo período (Janeiro-Setembro) resulta em 580, ou seja:

MAIS 88 MORTOS EM 2012.

Portanto, AS MORTES NAS ESTRADAS AUMENTARAM EM PORTUGAL NO PERÍODO CONSIDERADO EM 17,9%, ao contrário do que noticia o Público.

Portanto: a ANSR quer ficar bem na fotografia, nem que com isso manipule a informação de forma grosseira. O Público não se dá ao trabalho de confirmar o que o organismo diz e publica para a posteridade uma notícia que é desde logo incorrecta porque não se chamam dados anuais a contagens que não incluem todos os meses.

terça-feira, 18 de dezembro de 2012

Pedalar é mesmo no meio da estrada - A Lei

Uma das críticas mais comuns dos automobilistas em relação aos ciclistas é "circulam no meio da estrada". Com isto pretendem dizer que os ciclistas atrapalham o tráfego, pois deveriam circular junto à berma, permitindo a passagem mais fácil de automóveis, na mesma via.

Uma das bases para esta ideia é o conhecimento que genericamente existe de uma norma do Código da Estrada que indica que todos os veículos devem circular o mais à direita da faixa de rodagem. Genericamente, considera-se que uma bicicleta deveria então circular a, digamos, uns 20cm da berma. Na verdade, esta ideia está apenas parcialmente certa pois falta o remanescente do que na verdade indica o

Art. 13.º do Código da Estrada:
1. O Trânsito de veículos deve fazer-se pelo lado direito da faixa de rodagem e o mais próximo possível das bermas e passeios, conservando destes uma distância que permita evitar acidentes.

 Ora aqui está o segundo elemento desta norma que permite perceber que a obrigação de circulação o mais próximo possível das bermas e passeios tem uma limitação que é casuística, pois tem que ser conservada uma distância que permita evitar acidentes. Aliás, é muito comum que os automóveis façam o mesmo e circulem a uma distância segura da berma quer seja nas cidades quer em vias rápidas.

E que acidentes são esses, que se pretende evitar? Como às vezes uma imagem vale mil palavras, veja-se um desenho de Bekka Wright, no seu site Bikeyface:



Lembremo-nos que um ciclista conduz um veículo mas continua tão frágil quanto um peão, pelo que não pode ser tratado da mesma forma que um automóvel quando circula na estrada. Deve antes ser protegido e diferenciado positivamente.

Continua....