terça-feira, 18 de dezembro de 2012

Pedalar é mesmo no meio da estrada - A Lei

Uma das críticas mais comuns dos automobilistas em relação aos ciclistas é "circulam no meio da estrada". Com isto pretendem dizer que os ciclistas atrapalham o tráfego, pois deveriam circular junto à berma, permitindo a passagem mais fácil de automóveis, na mesma via.

Uma das bases para esta ideia é o conhecimento que genericamente existe de uma norma do Código da Estrada que indica que todos os veículos devem circular o mais à direita da faixa de rodagem. Genericamente, considera-se que uma bicicleta deveria então circular a, digamos, uns 20cm da berma. Na verdade, esta ideia está apenas parcialmente certa pois falta o remanescente do que na verdade indica o

Art. 13.º do Código da Estrada:
1. O Trânsito de veículos deve fazer-se pelo lado direito da faixa de rodagem e o mais próximo possível das bermas e passeios, conservando destes uma distância que permita evitar acidentes.

 Ora aqui está o segundo elemento desta norma que permite perceber que a obrigação de circulação o mais próximo possível das bermas e passeios tem uma limitação que é casuística, pois tem que ser conservada uma distância que permita evitar acidentes. Aliás, é muito comum que os automóveis façam o mesmo e circulem a uma distância segura da berma quer seja nas cidades quer em vias rápidas.

E que acidentes são esses, que se pretende evitar? Como às vezes uma imagem vale mil palavras, veja-se um desenho de Bekka Wright, no seu site Bikeyface:



Lembremo-nos que um ciclista conduz um veículo mas continua tão frágil quanto um peão, pelo que não pode ser tratado da mesma forma que um automóvel quando circula na estrada. Deve antes ser protegido e diferenciado positivamente.

Continua....

sexta-feira, 14 de dezembro de 2012

Crianças atropeladas dentro da escola? Culpa delas!

A auto-sociedade é uma doença e nem crianças estão a salvo

Repare-se nesta notícia de um atropelamento de duas crianças de oito anos dentro de uma escola. Sim, um automóvel atropelou duas crianças dentro do recinto escolar, onde é suposto estarem a salvo destas bestialidades. Mas a notícia não se fica por aí., porque há-que perceber o que é que aconteceu, apurar alguns factos.

Segundo a Lusa, o acidente "envolveu uma viatura que fazia marcha atrás". Ora daqui poderíamos começar a pensar que provavelmente, sendo esta manobra considerada como "perigosa" pelo Código da Estrada e estando o condutor a conduzir dentro de uma escola, onde, se bem me recordo, é rica em crianças desvairadas de todas as idades, poderíamos pensar, dizia, que o condutor não tinha tomado o devido dever de cuidado. E daí ter resultado o dito atropelamento que causou "um traumatismo craniano grave" numa das crianças.

Mas não. Informa-nos a notícia que o condutor da viatura era o fornecedor de pão da escola (assim se justificando a sua presença) e que não estava alcoolizado. Mas se não estava alcoolizado, o que o terá levado a atropelar duas crianças de oito anos? A tal omissão de dever de cuidado extra de quem conduz uma máquina em marcha-atrás dentro de um recinto escolar? Nada disso. Ao que nos é dito, "as crianças estavam a brincar sem ter em atenção a presença da viatura". Cá está, a culpa foi encontrada! As crianças de oito anos brincavam em total desrespeito pela presença de uma viatura dentro do recinto escolar, colocando-se na sua retaguarda no momento em que esta resolveu recuar como é de direito.

Essa ideia de brincar em desatenção da presença dos automóveis dentro de uma escola é manifestamente inaceitável e tem que ser combatida. Proponho desde já a criação de programas a serem implementados por esse país fora, a ensinar as crianças de oito anos a comportar-se dentro do recinto escolar. Só assim podemos parar esta chaga de se atirarem para cima de carros que circulem em marcha-atrás, ferindo-se gravemente.

segunda-feira, 10 de dezembro de 2012

Para mais pessoas, mais espaço para... carros?



There were seventy pedestrians for every ten cars in Times Square, but cars were louder and more catered to, so, "you know, the balance was in the wrong direction." 

Janette Sadik-Khan, in Esquire


Rua Garrett 09/12/2012

O conceito é simples: Se numa rua, o número de pessoas a pé é largamente superior ao número de pessoas que nela circula de carro, porque é que a maior percentagem do espaço disponível é atribuída aos carros?

Veja-se a Rua Garrett, em Lisboa:

No Domingo passado estava como documentam as fotografias. Havia pessoas por todo o lado, incluindo a estrada, porque os passeios não são de todo suficientes para o fluxo que a procura. Pessoas de todas as idades e com carrinhos de bebé ocupavam a rua em toda a largura disponível, conscientes de que aquele é o seu lugar natural e que é daquela forma que melhor se vive e desfruta do ambiente.


Rua Garrett 09/12/2012


As centenas (milhares?) de pessoas que por ali passam todos os dias certamente não precisam de lá passar de carro para aceder à rua, porque há uma saída do Metro no topo e no fim da mesma, mais eléctricos e autocarros em várias direcções.


Rua Garrett 09/12/2012


Por isso é legítimo perguntarmo-nos porque é que ainda é possível circular de veículo motorizado na Rua Garrett, depois do êxito que foi o fecho ao trânsito da Rua do Carmo?


Rua do Carmo, 09/12/2012


Actualmente, é permitido estacionar do lado direito da via, sendo que o estacionamento do lado esquerdo, embora proibido, sucede-se sendo ignorado pelas autoridades, como as fotografias bem documentam. E ainda sobra espaço para outras viaturas passarem, pelo que há espaço de sobra para 3 automóveis, enquanto nos passeios as pessoas que verdadeiramente dão vida à rua se acotovelam para cruzar umas com outras.


Rua Garrett 09/12/2012


É pois urgente a requalificação daquele espaço, para o tornar, no mínimo, uma área pedonal a que os residentes, e só estes, poderão aceder de automóvel. O espaço deveria ser totalmente atribuído às pessoas, com o passeio nivelado com a rua, sem qualquer lugar de estacionamento e regras bem definidas de cargas/descargas.

Rua Garrett 09/12/2012

Não tenho qualquer dúvida que seria um sucesso enorme, podendo ser estendido às laterais e respectivo Largo do Carmo que está mais confuso do que nunca com a ocupação de que foi alvo pelas esplanadas.

Só pecava por tardio. 

Um exemplo: Grafton St, Dublin, Irlanda.





quarta-feira, 5 de dezembro de 2012

Ciclovia na Av. da Liberdade - A análise holandesa

A Holanda é conhecida e reconhecida pela aposta na utilização da bicicleta como modo de transporte ideal dentro das cidades. No passado dia 17, estiveram em Lisboa dois representantes da Dutch Cycling Embassy, para uma conferência de partilha da experiência e conhecimento holandês no planeamento e gestão de tráfego direccionado à inclusão da bicicleta. Essa partilha foi feita através da coordenação de grupos de estudo de representantes nacionais de entidades interessadas.

Este é um documento muito relevante, dado que os especialistas mencionam erros já antes identificados pelos ciclistas e suas associações relativamente ao desenho e integração de ciclovias já construídas no espaço urbano pela Câmara Municipal de Lisboa (que esteve representada).

Abordo aqui especificamente críticas directas à solução encontrada para a inclusão das ciclovias na Avenida da Liberdade. Recorde-se aqui que essa solução já tinha sido criticada pela MUBi, crítica essa desvalorizada pelo Vereador dos Transportes, Fernando Nunes da Silva.

       Nota ao conteúdo da notícia acima linkada: O vereador não pode lavar as mãos da solução encontrada com o argumento "...é um problema entre duas associações". A discussão de diferentes opiniões e argumentos são naturais e desejáveis, mas é à Câmara Municipal que cabe tomar decisões fundamentadas com base nos seus próprios técnicos e pareceres. Se a CML optou pela solução de ciclovia no meio da avenida, partilhada com a faixa do BUS, é porque acredita ser a melhor opção e tem que o justificar.

Proposta da CML para a nova configuração da Av. da Liberdade

E o que concluiu o grupo de estudo coordenado pela Dutch Cycling Embassy, quanto à solução proposta para a Avenida da Liberdade?

  • Que a solução BUS + BICI não é muito segura nem confortável para os ciclistas. Foi analisada a possibilidade de implementação de Pistas Cicláveis, mas verificou-se que, para serem implementadas, implicam a alteração do desenho da avenida, o que não é possível, dado ser uma zona de identidade histórica preservada. Essa solução não é, portanto, possível, pois resultaria num desenho deficiente e perigoso (ou seja, se não é possível fazer bem, não se faz). 
  • A hipótese de utilizar as faixas laterais em toda a sua extensão, é admissível, mas carece de estudo a forma como são feitas as intersecções nos cruzamentos. Neste caso, a via poderia ser bidireccional apenas para bicicletas, aproveitando uma das faixas que agora é atribuída a estacionamento.

Ou seja: A Ciclovia no centro da Av. da Liberdade não merece a aprovação de quem tem conhecimento e experiência, afigurando-se perigosa para os utilizadores.

Pretender a CML atirar os ciclistas à força para uma zona insegura é inaceitável. Mantendo-se a via central sem ciclovia, os ciclistas mais audazes poderão sempre lá passar. Mas certamente que quem é pouco confiante ou experiente tenderá sempre a usar as faixas laterais.

Apela-se portanto à Câmara Municipal de Lisboa que seja capaz de corrigir o erro e encontrar uma solução mais equilibrada com o objectivo proposto de facilitar a circulação de bicicletas neste eixo estrutural da cidade de Lisboa.